sexta-feira, 5 de junho de 2009

Apenas Fogo (Série: Uma Foto por um Conto)


Chegou no Rio de Janeiro no verão. Foi visitar uma tia.

Sinésio tinha pouca graça. Era baixo, um tanto desproporcional, mas naquela noite, num bar em Copacabana roubou um sorriso faceiro da cabrita mais formosa que já tinha deitado os olhos. Cabelo vermelho, mas vermelho mesmo daquele jeito, jamais tinha nem ouvido falar em Juazeiro.

Ainda de espírito acanhado pelo corno que levara de sua futura ex-mulher, Sinésio ficou sem jeito. Mas seu coração parecia um bode amarrado. Acabou sendo arrastado pelo olhar encapetado, aquela pele alva e aqueles cabelos vermelhos. E se perdeu Sinésio, na noite de Copacabana.

De manhã, pão com margarina molhado no café e uma cara de abestalhado, feliz como nunca:
- Minha tia Jurema, acho que vou morar aqui no Rio. Vou casar com uma moça que conheci aqui.
- Mas, Sinésio! Já não basta o corno de Juliana, você já vai se entregar pra uma moça assim de primeira noite? Ainda mais aqui do Rio!
- Minha tia, ela me ama, ela disse com todas as letras que mê-é-mé, a-mê-a-má!

Na tarde desde novo dia na vida de Sinésio, um passeio romântico ao Pão-de-Açúcar. O cabra da alma renovada e a moça do cabelo vermelho. Uma beleza aquele mar, aquilo tudo, aquela moça. Sinésio achou que estava no céu, abriu seu coração e pediu a ruiva em casamento.

- Puô cara, qualé? Pirou?
- Mas você disse que me amava!
- Puô cara, aê: era só fogo.

Sinésio, aperreado, olhou aquela imagem da moça ao sol e viu, num lampejo, seu cabelo de fogo lamber o Cristo Redentor. Perdido em beleza sem fim, passou-lhe a certeza da mensagem que havia recebido. Aquilo tudo era um chamado de Nosso Senhor.

Sentiu o vento frio no seu peito gelado, deixou o corpo pender e morreu consumido pelas chamas.


Fotografia tirada no Cristo Redentor, em janeiro de 2009 - a moça do cabelo vermelho é por mim desconhecida. Por Sinésio, tão pouco

2 comentários:

  1. Kkkk... Coitado do Sinésio!

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  2. Muito bom, Pablito. Quem não morre um pouco como o Sinésio a cada dia que dá de cara com cabelos vermelhos, pretos, castanhos tão ali ao lado e tão distantes. Um paraíso perdido no sorriso, no jeito, no olhar que não vê ou se vê, ama, ignora, dá bola,se entrega, cospe fora, fascina, como se o destino pudesse ser resumido na pintura da moldura que captura os cabelos como uma tênue lembrança do que poderia ter sido.

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